sexta-feira, 4 de junho de 2010



Parece-me ironicamente inadmissível a situação a que assisto (na realidade, não assisto, vivo na pele, mas parece sempre muito mais objectiva uma queixa de indignação se formos elementos imparciais, pelo que o 'assisto' soa bem melhor). Enfim, perdi-me no adjectivo 'inadmissível' quando na verdade pode-se chamar também escandaloso.





Já referi que trabalho numa unidade de saúde, serviço de urgência. Aqui entra tudo ! Tudo, mesmo antes de se saber o que é!


Claro está que estamos exposto a todo o tipo de doenças, viroses, bactérias e tudo mais.


Claro está que trabalhamos no meio da loucura, do stress, da emoção, da adrenalina, da dor, da insatisfação, da surpresa, da morte, etc.


Claro está que trabalhamos por turnos, de forma a manter o horário que é exigido a uma urgência: 24 horas de funcionamento!


Exceptuando os encerramentos permanentes e economicamente justificados, feitos pelo recentemente pelo Estado Português, NUNCA vi esta urgência encerrar, quer para férias, quer para balanço, quer para obras, quer para desinfecção (sim, mesmo quando esta ocorre é efectuada por sectores, mas sempre com as portas abertas!).


Claro está que trabalhamos TODOS que nos fartamos, claro está que saimos daqui de rastos quando no dia a seguir temos de voltar para o mesmo campo de guerra (muitas vezes com um descanso inferior a 8 horas entre turnos, sim porque temos de estar prontos para assistir e atender qualquer pessoa, qualquer uma que seja, sem qualquer tipo de discriminação em relação ao que quer que seja, porque todos temos direito a assistência médica, mesmo que estas sejam as pessoas que mal dizemos sistema de saúde, nos insultam, nos agridem e nos chegam a ameaçar de morte! continuando-nos a caber a nós manter a calma, o respeito e o cuidados ao respectivo).





Depois de todas estas clarividencias, parece-me a mim que ainda mais claro está que fui premiada (mais uma vez) com um bicharoco que há cerca de 7 dias se instalou no meu sistema, sem pedir autorização, provocando-me dores de garganta como até então desconhecia, febre, dores de cabeça, dores musculares, vómitos, falta de apetite, perda de peso e tosse. O bicharoco malvado estava a levar a melhor de mim quando decidi, ao segundo dia (no mesmo em que perdi a voz e percebi que isto poderia ser mais que uma gripe) deixar o ben-u-ron e falar com a médica. Esta prescreveu um antibiótico. O antibiótico foi tomado, as dores e afonia continuam e aqui estou. Praticamente na mesma!





Até aqui dá para entender o meu desagrado ou tristeza, já que é da minha saúde e bem estar que se trata. Mas o que escandalosamente me indigna é o facto de estar neste estado e não me ser reconhecido o direito a colocar baixa médica, uma vez que se o faço não há pessoal suficiente para garantir o serviço. O que me indigna é trabalhar para o Estado, defender a sua honra através da imagem deste serviço, tendo todo o brio, cuidado e simpatia no meu serviço. Trabalhar para um Estado que se diz de 'direito', um Estado que assina e aprova o Código do Trabalho e os direitos dos trabalhadores e é o primeiro a não os cumprir. Não se cumprem os horários de descanso durante os turnos porque se tem de dar resposta aos utentes e familiares; não se cumprem o número de folgas a gozar; não se cumprem o pagamento de horas extraordinárias, que são feitas mas que não são pagas; não se cumprem regras de segurança e higiene no trabalho; não se garante (nem de perto, nem de longe) a protecção da nossa saúde e integridade física mas também não nos é atribuído nenhum subsidio de risco; não são cumpridas as regras no que toca à mudança de turnos; não se admite mais pessoal devido à crise e à consequente e imperativa redução de custos...





Sei que estamos numa fase terrível, sei que esta é a realidade, que a culpa não é do Sócrates, dos capitalistas ou dos anarquistas: é de todos e de ninguém! Mas, POR AMOR DE DEUS, não voltemos à exploração laboral, não recuemos ao ponto do próprio Estado que impõe e coage para que as suas regras sejam cumpridas seja o primeiro a ser-lhes desleal, colocando em causa a saúde física e psíquica dos seus funcionários.

1 comentário:

  1. Não sei o que te dizer...TENS TODA A RAZÃO, E deves sentir uma revolta....

    Não é nada justo !!



    a coisa está NEGRA e é GERAL...

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Simplicidades